terça-feira, 17 de março de 2009

Acabou.

Ele virou de lado na cama, passou os dedos pela cintura dela e falou, baixinho, no ouvido.
- Acabou.
Como assim, acabou? Já são treze anos de casados! Dois filhos, casa em Gramado, conta conjunta, viagem de férias pra Torres programada e acabou?
- Acabou.
Ele se levantou e começou a vestir as calças de brim. Abotoou a camisa, deu nó na gravata, calçou os sapatos.
-Sou eu. Só pode ser eu. Me diz. Que eu fiz? O que eu mudo? Rubens, não sai assim. Rubens, tua gravata tá torta. Rubens, olha pra mim. Diz que não vai. Me alcança a minha camisola. Rubens. Ru. Binho. Olha pra mim.
- Onde tá a minha raquete?
- No closet. Rubens. Eu vou me matar, Rubens. Tu vais deixar o Lucio e a Izinha sozinhos? Rubens. To falando contigo.
- Maria Lucia. Acabou.
A mala estava fechada em cima da cama e ele procurava as chaves na cestinha da mesa de cabeceira.
- Nunca acho essas chaves. Não adiantou nada colocar esse sensor para palmas.
Clap. Clap.
- Tão aqui, de baixo da cama.
Clap. Clap
- Rubens, vou me jogar da janela. Olha pra mim, Binho. Sou eu, né? Me diz, Binho. Ali, ó. As tuas meias ficaram no chão. Rubens. Amor.
Eles se olham, em silêncio.

....

- Sabe que mais? Então vai. Vai que eu não te mereço, infeliz. Eu, aqui, chorando por ti, pensando em me enforcar no fio do varal, por ti. Pensado em deixar os meus filhos na mão de qualquer porca que tu fores encontrar. Nunca, Rubens. Nunca. Vais ter que conviver com a minha presença. E a minha indiferença. Cretino filho da puta.
- Ok.
- Ok?
- É. Ok.
- Mas...
- Mas?
- Ok?
- Sim. Ok.
Bateu a porta e saiu, com os gritos de Maria Lucia ao fundo.

...

Cinco minutos depois voltou. Maria Lucia tinha a maquiagem borrada e a cara inchada.
- E então? Fui bem??
- Foi sim, Binho. Mas semana que vem sou eu que vou embora, tá?
- Tá bom... Adorei a parte das palmas. (Clap. Clap.)
- Que bom. Agora vem aqui.



segunda-feira, 16 de março de 2009

Segunda

Parece que todos os dias são segunda-feira.
Que não teve final de semana, não vi nem o sábado nem o domingo passarem e já acordei na manhã de segunda, sem ter tido tempo de nada.
Não dormi até tarde, não fui na Redenção, não vi meus amigos ou fiquei com a família. Não aproveitei a noite nem o dia. Mal o vi sol, mal senti o vento, mal me molhei na chuva! Nem bati na quina da cama! Ou bati? Não lembro... já faz tanto tempo. Hoje já é segunda. Hoje ainda é segunda.

Esse tempo tem me feito falta.
Daqui a algum tempo, esse tempo vai fazer é uma falta danada.
Eu sei.

terça-feira, 3 de março de 2009

Já faz horas que não visito esse lugar. Que antes me era tão conhecido e aconchegante. Confortante.
E que agora virou sótão com lençóis brancos por cima dos móveis e poeira espalhada pelo chão. Fazia tempo que não me via assim.
Sozinha. Não só.
Já se vão anos que a companhia de outros me faz companhia.
Agora tenho a mim para me acompanhar.
Coração leve. Solto. Calmo. Aberto. Feliz.
Cheio.